Goiânia

Encravada nas montanhas e construida em solo rochoso, a cidade de Goiás, Capital do Estado, tinha de encanto o casario colonial, cujos quintais terminavam em córregos de água fresca. Nos salões da oligarquia, herdeira da riqueza criada pela exploração do ouro, falava-se tanto o francês quanto o português, as igrejas construídas por escravos ostentavam imagens barrocas pintadas a ouro, obra do escultor Veiga Valle. Mas o luxo dos livros e das sedas importadas convivia com a desesperança de uma cidade onde, nas primeiras décadas deste século, já não se construía mais do que uma casa por ano, e nas noites de luar, o lirismo das serenatas era pontuado pelos gemidos da febre, provocada pelo esgoto a céu aberto. Jornal o Popular Goiânia

Já em 1.830, o Marechal de Campo Miguel Lino de Morais, segundo Presidente de Província de Goiás no Império, lançou em primeira mão, a idéia da mudança da capital goiana. Imaginou-a no norte, nas proximidades de Água Quente, consoante noticia o historiador Americano do Brasil, acrescentando que a opinião não agradou ao espírito da população da cidade. O argumento contrário à primeira vista, pareceu decisivo. Como poderia um Estado pobre, supremamente pobre, um governo sempre endividado, permitir se o luxo de construir uma nova capital? Deste ponto de vista, a construção de Goiânia podia ser qualificada de "loucura", de "catástrofe para a economia goiana", ou, simplesmente, de "ato de prepotência".



A idéia de mudança reapareceu em 1.863, prestigiada agora pelo gênio de Couto Magalhães, misto admirável de guerreiro e administrador, que a expôs em seu livro "Primeira Viagem ao Rio Araguaia". São palavras suas: "Temos decaído desde que a Indústria do ouro desapareceu. Ora, a situação de Goiás era aurífera. Hoje, porém, que está demonstrado que a criação de gado e agricultura valem mais do que quanta mina de ouro há. Continuar a capital aqui, é condenar-nos a morrer de inanição, assim como morreu a indústria que indicou a escolha deste lugar ". Depois dele foram legisladores goianos que sustentaram, por algum tempo, acesa essa idéia. A constituição do Estado de 1.891, inclusive sua reforma de 1.898, e a de 1.918 previam taxativamente a transferência da sede do governo, havendo disposto esta última, em seu artigo 5º: "A cidade de Goiás continuará a ser a capital do estado, enquanto outra coisa não deliberar o Congresso".
A revolução de 30 deu um idealista da mesma têmpera de Couto Magalhães a Goiás. A 22 de novembro desse ano assumiu o Governo do Estado, como interventor Federal, o médico Pedro Ludovico Teixeira. Quem era esse Homem ? Nasceu na virada do século, em 1.891, na cidade de Goiás. No Rio de Janeiro onde se formou em Medicina, tornou-se amigo de Lima Barreto e de Olavo Bilac e defendeu tese sobre a histeria, numa época em que todas as teorias de Freud eram completa novidade. De volta a Goiás, instalou sua clínica em Rio Verde, mas achava a vida monótona e caiu em melancolia. As viagens ao Rio combatiam o tédio, que ele venceu ao descobrir dois amores da vida inteira: a política e Dona Gercina Borges, com quem se casou.


Governou o estado em cinco períodos, como Interventor ou Governador eleito duas vezes. O construtor de Goiânia lutou pela construção de Brasília, defendeu as reformas sociais e o voto dos analfabetos. Foi Senador eleito em três mandatos, o último interrompido com a cassação de seus direitos políticos, em 1.968. Continuou ativo, lutando pela redemocratização do País. Pedro Ludovico faleceu em 1979.







 
 
O Tabelião de Campinas, Manuel Aranha dos Reis, registra em linguagem gongórica o gesto generoso do fazendeiro Andrelino de Morais, que doou cinqüenta alqueires de suas terras para a construção da cidade. Maria de Lourdes, filha de Andrelino, não participou da cerimônia. Com um grupo de amigas, ela percorria os barracões de madeira a procura de crianças, que ia matriculando para a futura escola que o pai já estava construindo na Vila Nova: a primeira escola da nova capital, mobiliada com carteiras importadas de São Paulo. Enquanto isso nas margens do Botafogo, Dona Maruca caprichava no tempero da comida. A pensão de Maruca era preferida dos funcionários graduados, freqüentada especialmente pelos engenheiros Abelardo e Jerônimo Coimbra Bueno, responsáveis técnicos pela construção .


Os operários, vindos de Minas, São Paulo e dos estados nordestinos, sonhavam construir um mundo novo, enquanto sentavam tijolos e levantavam o madeiramento dos telhados.A desilusão de Maria de Lourdes se fez mais rápido: seu nome não constou na lista de Professores nomeados para a nova escola. Precisava dar-se nome à Nova Capital. Em outubro de 1.933, o semanário "O Social", havia instituído um curioso concurso a respeito. Leitores de todo o Estado contribuíram, sendo interessante relembrar os nomes mais votados. Eis alguns: Petrônia, Americana, Petrolândia, Goianópolis, Goiânia, Bartolomeu Bueno, Campanha, Eldorado, Anhanguera, Liberdade, Goianésia, Patria Nova, entre outros.